domingo, 7 de dezembro de 2014

Sobre o vento...

A cortina não está em seu lugar. 
Esvoaçante pela sala, parece dançar com um companheiro invisível.
De repente se aquieta e volta a se alinhar à parede. Estática. 
Passaria despercebida se não fosse o vento tira-la para dançar. 
Lá no mar, como deve estar? Ondas de três metros já devem ter chego à costa. 
O vento acorda o mar. Me imagino lá agora... 
Na janela, passa pela fresta e assobia. Um barulho de medo, mas bom. 
Balança os fios do cabelo, refresca os pés sem meia em cima do encosto do sofá. 
Eu olho para ele sem ver. Acho que ele me vê e acaricia-me o rosto. Sabe que estou ali apenas para senti-lo. 
O aroma é indescritível. Queria um perfume de vento. 
Um cheiro misterioso como a escuridão da noite.Diferente do aroma do vento que sopra quando é dia. 
Um cheiro que traz as coisas que só acontecem na madrugada. 
De todas as estrelas que caem do céu e poucos veem. Dos espetáculos noturnos sem plateia. 
"Coisas belas não pedem por atenção". 
O sono ainda se faz necessário. 
Seja o vento, talvez, as notas musicais do silêncio. 
Uma música tocada sem maestro conhecido. 
O vento que navega o veleiro. 
Que afasta o balão. 
Segura a sacola vazia no ar. 
Sabe fazer sinfonia com as folhas das árvores. 
Põe o poder dos seres humanos para dentro de casa. 
Deixa a rua deserta. 
Se faz majestoso e reina. 
Pela casa, além da sua ilustre presença, trouxe com ele o cheiro da brisa do mar...

sábado, 22 de novembro de 2014

Zona de conforto

Saia da zona de conforto. Maravilhas acontecem. A vida será vivida. Viagens, músicas e novas pessoas, bicicleta na estrada com mochila ou no meio do trânsito caótico: a felicidade. Feliz porque saiu da caixinha. Anúncios da rede social. Anúncios do YouTube. Google.

Tudo é maravilhoso na vida pós zona de conforto. Assim como tudo tem que ser lindo nas propagandas, essa é mais uma em que tudo obrigatoriamente corre bem. Seria este um novo nicho de mercado? Mexer com a emoção dos sonhadores? No fundo dá dinheiro...

Prega-se nesse roteiro uma certeza. Aí está a pegadinha ou a falta do lembrete que só as pessoas "chatas" dão. Esquecem-se de avisar-te sobre a coragem, a paciência, os dias de trabalho incessante, os dias de sono sem descanso, os feriados em casa sem dinheiro, a angústia por não saber se todo o sacrifício feito ao sair de um caminho e começar em outro valerá a pena.

Seria tudo apenas mais um truque da publicidade com vídeo e trilha sonora bem editados (daqueles que arrepiam) da maior influenciadora do comportamento moderno: a internet? Não ela em si, mas a visão que ela permite ter. Afinal as plataformas são novas, mas as bases que regem a sociedade ainda são antigas e muito bem consolidadas. Eis o grande conflito atual.

O mundo é tudo isso sim, mas o ser humano é apenas humano. Por isso que dói. Ver onde se pode chegar mas perceber que a gente depende de nós. As mensagens mais sábias já existiam - como que premonição- muito antes de toda esta modernidade:

"O maior inimigo do homem é o homem."                    Robert Burton
"O maior inimigo da criatividade é o bom senso ... "    Pablo Picasso    

O maior inimigo do homem é ter na cabeça ideias gigantes que não cabem no tamanho do mundo, não pelo espaço físico, mas pelo espaço que damos a tudo que é difícil. A cegueira que nos invade quando a mágica da ideia quer sair da cabeça, mas nota-se que precisará das coisas materiais que ela não possui e mesmo assim ela continua em você e tão profundamente, até achar uma maneira de conseguir ser realizada.        Respiro.

Me lembro disto: "- Condenado a ser feliz - É uma frase que eu li há algum tempo que diz que às vezes a gente tá condenado a ser feliz. E eu gosto bastante dessa frase, eu acho que ela explica muita coisa.

Quando eu resolvo tocar piano com 18 anos, que eu quero estudar, eu fui buscar professores de música erudita, de piano clássico e claro eles não quiseram me dar aula porque eu já estava muito velho pra começar a estudar. Então eu acabei estudando sozinho. E nesse sentido eu senti que era quase uma condenação porque pra mim ainda era uma pergunta: será que eu vou realmente tocar piano, será que eu vou saber tocar piano?

E eu percebi que se eu não tocasse eu me sentiria muito triste. Então, pouco a pouco eu fui percebendo que era isso né, quer dizer... que às vezes a própria vida te apresenta o desafio e você não tem escolha senão encarar este desafio."

Um pensamento que o grande Músico (sim, em caixa alta) Benjamim Taubkin dividiu conosco. Mudou você? Porque mudou a mim. Me encanta o poder de dividir opiniões, mudar pontos de vista. Antes disso, nunca tinha parado para pensar nas inquisições que a vida faz: -Você está julgado a ser feliz, mesmo que antes seja muito triste.
                                          
Será que eu vou conseguir fazer o que me propus? Este seria o desafio que a vida me ofereceu com a paixão que tenho pelo Jornalismo? O arrepio que nasce na alma ao ver as histórias se desenhando em palavras no papel? Ou em imagens que nos ajudam a ver com a visão que o nosso próximo tem da vida... Será que eu vou conseguir colocar em prática o que nasce na minha cabeça? Será que tem neste momento mais gente pensando se conseguirá ser?

Sigamos na dúvida até quando assim for permitido. Só que eu cansei da dúvida. Será este um bom sinal? Dúvida de  novo...

Assista: https://www.youtube.com/watch?v=bAa2v91TLgw#t=86

sábado, 20 de setembro de 2014

Mau elemento ... ?

19h40, Jabaquara. Do lado da padaria, as vans que fazem fretado.
- Moço, ainda tem lugar? 
- Tem só um aqui na frente. 
- Ai que bom.
Sento. Coloco o cinto. Fone no ouvido e as músicas do celular. Cinco minutos depois entra e senta do meu lado um moço mal encarado.Cara fechada, magro, boca de bico, olhos pequenos, sobrancelha truncada. Coloca o cinto, esbarra em mim, mas não olha. Não diz boa noite. Na mão uma mochila e uma sacola. A van parte. Fico tensa. Perto do pedágio ele abre a bolsa. Enche a palma da mão de trouxinhas de plástico e joga na sacola. Estava certa. Ele era mesmo um homem perigoso. "Acho que na hora de descer vai nos assaltar"! Penso numa maneira de me aproximar dele. Quem sabe assim ele não leva meu celular. Tiro um saco de balas da mochila.
- Motorista, quer?
- Aceito uma, obrigado!
- E você, quer?
- Não moça, obrigado. Tô satisfeito.
E sorri de leve.
A viagem segue.Fico mais tranquila. Acho que ele não é tão mau assim. No fim da Serra, ele tira da sacola um pacote. É doce de leite em barra.
- Quer, moça?
- Não, obrigada!
- Motorista?
- Não, obrigado.
Ele come sozinho. Chegamos em São Vicente.
- Vai descer aonde, moça?
- Presidente Wilson.
- E você moço?
- Na divisa.
Chega meu ponto. O "mau elemento" desce para que eu possa passar e segura a porta para mim.
- Tchau moça. Vai com Deus. Bom descanso.
- Obrigada. Que Ele também vá com você.
O mau elemento sorri. E eu também. "Julgue a si mesma, Vanessa".

sábado, 19 de julho de 2014

O metrô.

Hoje eu acordei com vontade de escrever. Só uma história de histórias, não muito interessantes para ninguém, mas tudo bem. Hoje eu acordei pensando como a vida se encaminha...

Trabalhar em São Paulo, para mim, é novo. A experiência do metrô também. Há quem diga que eu me impressiono demais com as coisas, tipo caipira em cidade grande. Bem, realmente, eu não ligo. Eu gosto de manter os olhos abertos e ligados em qualquer detalhe. Gosto dessa coisa de reparar em tudo, desde a placa de aviso em caso de emergência até o jeito como alguém se segura no metrô. Claro que dessa forma, nem sempre os olhos veem aquilo que gostariam, mas tudo bem. Talvez a gente tenha mesmo que ver.

Um dos meus maiores medos sempre foi e ainda é, perder a sensibilidade perante as coisas da vida. Ser este tipo de gente que não se emociona com um cachorro abanando o rabo, não liga para a dor de quem passa fome, não luta mais e se esconde por trás da frase que "sempre foi assim e não vai mudar". Não escuta música.

Tenho medo do cansaço. Não o físico. O mental. Em mim, quando ele bate, é uma força tremenda que faço para ele ir embora. Até agora eu consegui. Espero conseguir sempre, até o dia que a vida de "lá" me chamar de volta.

Quando chego na estação, fico com aflição.  É tanta gente que parece que estou perdendo as pessoas. Como se todo mundo fosse interessante e eu não posso conhecer todo mundo. Queria ter vários olhos para ver em 360º e não perder nenhum detalhe. São os detalhes que se transformam em memória e mudam a nossa vida. São eles que a gente conta como história depois.

Bom, mas tenho que me conformar que isso é impossível e eu só posso enxergar até onde minha vista alcança (lembrando que tenho 2,5 de miopia junto com astigmatismo). Consciente dessa condição, vivo de óculos ou lente e tento fazer como minha mãe sempre me ensinou: "olhos de ver, filha". Sabe quando a gente não acha uma coisa e fica gritando "mãe, cade não sei o que", e daí a mãe vem com cara de poucos amigos, pára exatamente aonde a gente está posicionado e pega a "coisa" que estávamos procurando? Algo que estava na nossa frente e a gente não enxergava? Isso são os olhos de ver que minha mãe fala. "Se eu for aí e achar, vou esfregar na sua cara"... Bom, sei que em algum momento da vida, todos nós vimos essas "coisas" beeem de perto... rs. Obrigada, mãe!

Com os olhos de ver, eu tento levar a vida. E ouvidos de ouvir, também. Praticamente todo mundo ali usa fone de ouvido. Fico imaginando o que cada um está ouvindo. Pelas expressões faciais, eu tento adivinhar. Ontem, fiquei de pé ao lado de uma moça que carregava uma bolsa de plástico gigante rosa e tinha cabelos vermelhos presos num coque. Ela balançava a cabeça. Pensei: é rock! Dei um jeito de olhar o visor do celular. Era gospel da igreja evangélica de não sei da onde. Surpreendente!

Outro dia, foi um menino de cabelos longos. Com blusa do Metallica, ele entrou, ficou de pé e abriu um livro de Darwin. Achei que queria mostrar o livro que estava lendo. Dava um jeito de mostrar bem a capa para as pessoas. Dei risada e achei legal este orgulho em querer mostrar o seu nível de leitura. Espero que realmente ele leia, para si mesmo. Ao dar passagem para duas senhoras que se seguravam uma na outra, penso que ele respondeu ao meu questionamento.

O estilo das pessoas naquele lugar é outra coisa que me chama atenção. Tive a honra de sentar à frente de um senhor com seus 80 anos e estilo puro. De chapéu, blusa de lã, calça com pregas bem demarcadas, maleta e cachecol. Fora os sapatos e o óculos de grau moderno. Uma aula de moda. E um gentleman. Tive a impressão que também curtia a arte de observar as pessoas. Olhava tudo e todos que entravam a cada estação. Sorria "maroto" para quem olhasse para ele. Sorriu para mim. Desceu na Consolação. Até agora estou curiosa para saber o que ele carregava na maleta. Tento sempre usar minha intuição e ela me diz que ele era muito gente boa. Os olhos falam também, até mais que a boca.

Ah... o menininho que chorou. Este eu escrevo rindo. Metrô bombando às 18 horas. Um pai jovem (acho que era o pai, mas poderia ser irmão, enfim) entra com um menino aparentando ter uns 6 anos. Eles ficaram de pé. Os olhos do menino me pareciam assustados com tanta gente grande esmagando ele. Como se ele estivesse num desenho animado no mundo dos gigantes. Olhava só para cima. Dei uma olhada no celular e quando olhei para ele de novo, estava chorando. Um choro sentido, silencioso e envergonhado, com lágrimas escorrendo pelo pescoço. O pai ou irmão perguntou algo que eu não consegui ouvir, mas deve ter sido: "por que tá chorando?" Não sei o que ele respondeu, mas o cara caiu na risada e o menino chorou mais. Me deu uma vontade de rir... Aquela carinha de criança assustada tentando se controlar e o pai ao invés de consolar, cascando o bico e segurando na mãozinha dele era de qualquer forma, uma situação engraçada.

Aquele menino era a representação de nós adultos. Ou vai dizer que não dá vontade de chorar de vez em quando, quando o dia foi terrível e na hora de ir para casa, o metrô te aperta igual sardinha enlatada. A diferença entre ele e nós e que ele podia chorar e a gente achar bonitinho. A hora que ele desceu, a carinha dele de alívio, me fez ter outra crise de riso silenciosa. Peguei o celular e fingi que estava falando com alguém pra não dar de louca e ficar rindo sozinha.

Na quinta, foi a vez de uma moça chorar. Devia ter uns 28 anos. Estava parada na minha frente há um tempão, mas só reparei nela quando ouvi um soluço. Tinha os olhos vermelhos e a expressão triste. Senti vontade de perguntar, mas não tive coragem. Quando as pessoas em volta perceberam que ela estava chorando, um silêncio se fez. Parecia que de alguma forma, todos estavam condizentes à tristeza dela. O silêncio é sempre uma boa maneira de se dizer algo quando não há o que dizer. Ela desceu na estação Paraíso. Espero que encontre o paraíso dela, de verdade.

No primeiro dia de metrô, meio confusa ainda, sentei no banco reservado. Um senhor entrou e ficou de pé. Eu não fiz por mal, mas de verdade não reparei. Mas reparei numa moça olhando feio para mim. Fiquei incomodada, ainda mais por saber que com ela, eu não podia brigar. Ela era muito grandona para mim. Aquele incômodo foi crescendo e eu comecei a tentar ver o que tanto em mim, incomodava ela. Quando olhei para cima, a placa: assento reservado. Tudo explicado.

-Ai senhor me desculpa, não percebi. Quer sentar?
- Não mocinha, obrigado. Velho passa tempo demais sentado!

Ufa, que alívio! Não ia mais apanhar. Na mesma hora, a voz da consciência falou comigo: "Vanessa, precisa que o assento seja reservado para você oferecer seu lugar para alguém?" Pois é... a loucura de conviver com muita gente em pouco tempo, têm me ensinado muita coisa.

Mas, estou feliz. Em uma semana de rotina nova vi muitas cenas de gentileza. Não sei se eu que sou otimista, mas tenho a impressão que as pessoas estão mais civilizadas. Os mais jovens então... Vi vários dando lugar aos idosos, grávidas ou para quem parecia mais cansado que eles. Vi gente ajudando cadeirante para passar na rapidez da porta do trem. Vi vaquinha para ajudar um cara que perdeu a carteira. Eu ajudei com R$ 2,00. "Sou estagiária, moço". Ele deu risada. Vi olhos mais observadores do que cansaço e mais sorrisos. Homens respeitando as mulheres na passagem para a loucura da escadaria rolante.

Claro, vi também seguranças imobilizando um rapaz. Não sei o que ele fez, meu horário não permitia que eu ficasse ali observando até entender o que tinha acontecido. E a síndrome de Fifi me consome... Vi gente mal humorada com cara de poucos amigos. Vi meninos muito novinhos para estarem trabalhando como vendedor ambulante. Vi gente demais no celular, meu Deus... tem muitas pessoas olhando para baixo o tempo todo. Essa parte eu não gosto não.

Vi placas e grafites com dizeres sensacionais. Vi uma cidade que não para e que eu não pude deixar de me apaixonar. Cada dia gosto mais daquela loucura toda. E de quantos detalhes ela carrega.

Não me perdoo por uma foto que deixei passar: um carrinheiro carregava a sua dama no seu carro de catar papelão. Ela segurava um guarda chuva todo quebrado, sentada em pose de princesa. Me lembrou as moças da década de 30. A Catarina de "O Cravo e a Rosa". Era um foto imperdível com a legenda: "Sua Dama". Bom, transformei a foto perdida em palavras para ver se diminui a minha sensação de "coisas imperdíveis".

Talvez, como a maioria dos amores, um dia eu canse disso tudo e queira distância. Mas, como todo amor que nasce, a gente sempre torce para que ele dure para sempre.

Vamos ver quantas histórias mais o metrô vai me contar...

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Não julgo, sou de Deus!

"Adolescente gay é achado desfigurado após se perder em festa em SP."
"Menos um na face da Terra. E temos muito por aqui que precisam da mesma lição. Homem tem que ser homem e mulher, mulher! O que saí disso precisa de "cura". A homossexualidade é uma doença. É o diabo atentando. É contra as leis de Deus, por isso a morte é o caminho quando não há solução. Mas não julgo. Sou de Deus."

"O estupro foi culpa da mulher, porque vestia uma roupa sexy e estava fora de casa em horários estranhos."
"Ah, mas com certeza! Mulheres tem que de se conter dentro da roupa. Esses vestidos, saias e decotes, isso instiga o homem e daí ele não consegue se segurar porque é o instinto dele. As mulheres tem de ser mais comportadas se não quiserem ser estupradas. Mas não julgo, sou de Deus".

"Mulher gosta é de dinheiro!"
"Me perdoe, mas tá aí uma verdade. Mulher gosta mesmo é de din din. Elas não trabalham fora, não chegam em casa e ainda tem que cuidar da casa, da janta do marido, dos filhos, das roupas, das compras e claro do corpo. Sim porque uma mulher tem a obrigação de se manter bonita para o seu marido. Até porque se ele não tem em casa, vai procurar fora e depois ela não vai poder reclamar por ter sido traída. Ela mereceu."

Mulher gostosa e solteira??
"Ihh meu irmão, deve ser lésbica, ou chata, ou ruim de cama. Algum problema ela tem!"

Homem gostoso e solteiro??
"Ihh gata, deve ser gay, ou chato, ou ruim de cama. Algum problema ele tem!"

Mulher promovida no emprego.
"É o famoso teste do sofá. Essa passou com mérito! Deu pro chefe com certeza, porque competente ela não é."  Papo de homens e entre as próprias mulheres também."

"Não adianta fazer yôga e não cumprimentar o porteiro."
Ae seu vagabundo, sai da frente, porra! Não sei porque esses maloqueiros, catadores de lixo ficam andando com essas carroças no meio da rua, atrapalham o trânsito, atrasam tudo, trabalhar que é bom não querem né... 

Ae cassete, foi fabricar a fruta para fazer meu suco? Não tenho paciência pra esse povo, garçom, garçonete, caixa... Bando de burro que não quiseram estudar. Agora ficam aí servindo a gente e nem isso fazem direito. Olha a demora pra trazer meu suco. Não vou pagar por este serviço! 

Ô meu filho, tá surdo, dormindo aí na guarita? Não pago teu salário pra ficar esperando você abrir o portão! Vamô caralh...! Porteiro, raça ignorante, tudo com cara de ex bandido. Se essa demora fizer murchar as flores que comprei pra ela... Desço e meto a mão na cara dele!

-Oi meu amor, lhe trouxe flores! 

-Oh, lindo, obrigada! Como você é gentil!

-Muito gentil, você quer dizer né minha linda?! Me dê valor viu, porque gentileza está difícil de se ver por aí hoje em dia..."

Na igreja católica, evangélica, centro espírita, umbandista, templos, religiões e afins...
- Bom dia irmã!
- Bom dia!
- O pastor... padre... mestre... guia espiritual... pai de santo... vai dar uma palestra falando sobre não julgar as pessoas.
Irmãos e irmãs aqui presentes, estamos aqui hoje para aprendermos mais um ensinamento de Deus: não julgar a quem quer que seja. Cada um tem dentro de si aquilo que o levou a tomar as atitudes que lhe guiam. Não estamos no lugar do outro para saber o que o levou a tomar essa ou aquela decisão na vida. Por isso, antes de julgar um pecador, há de se analisar o que o levou a tal ação e ponderar a situação. Se colocar no lugar das pessoas para ver o que faríamos se fôssemos nós em seu lugar. A exceção é levada em conta quando se observa falta de caráter do pecador. Fora isso, temos que observar e entender caso a caso, todos os lados para então opinar sobre o feito...

- Bonita palestra hoje né irmã?
- Linda! Adorei!
- Você chegou a ver no noticiário que um grupo de "justiceiros" no Rio de Janeiro que está espancando gays e supostos ladrões? Cortaram até a orelha dele... 
- Vi sim e achei certíssimo! Tem que é matar mesmo esse bando de pervertido e bandido. 
- Mas isso é julgar, né... Dizer que uma pessoa tem cara de bandido... Ou que um gay merece apanhar...
- Imagina irmã, não é julgar, é justiça, é fazer o certo! Tava  na cara que ele era bandido, na cara!! E outra, não julgo, sou de Deus!"


Cara de bandido.



Cara de bandido? Plenário, Brasília.




Só um PS: Aqui vai a opinião de uma pessoa que ouve, direto, que "viaja". Tem gente rica que rouba por falha de caráter, já que ligamos o fato do assalto à quem é pobre. Tem gente pobre que rouba pelo mesmo motivo dos ricos e gosta de ser malandro. Isto é falta de caráter e existe em QUALQUER lugar. 


Em meio a tantas diferenças sociais, o pobre não tem porque, lá de cima, roubam dele. Lá de cima é toda a sujeira chamada governo. Se tiram dele, ele rouba de quem está mais perto. Quem está mais perto somos nós, classe média, que tivemos educação, amor e cuidados. Saímos para trabalhar e trabalhamos porque estudamos um dia em uma escola decente e aliado a um bom caráter (com exceções, claro), hoje, temos oportunidades. 

Se eu nasço na favela, geralmente, não vou ter nada disso. Sendo assim não terei oportunidades. "Favelado" que foge disso e consegue mostrar que têm seu lugar ao sol é exceção e creio que não podemos ter como parâmetro as exceções.  Creio também que não há como cobrar aquilo que não foi ensinado, mostrado. É como cobrar de uma criança que ela seja responsável. 

Sempre que ouço "tá com dó, leva pra casa" imagino que, quem sabe se eles tivessem casa, não seriam ladrões. Talvez isto funcionaria como uma peneira, deixando cair somente aqueles que fazem porque gostam e os que fazem porque "é o que tem para hoje". 

Os países evoluídos dão condições de pelo menos,  ter o mínimo aos seus cidadãos. Então é óbvio que se todos têm, não precisam tirar dos outros. Não seria este um dado relevante que mostra que a desigualdade é a causadora de tanta violência? 

Os políticos desviam e roubam as verbas que seriam para a educação. Sem educação, crescem e assaltam quem teve  e trabalha duro para ter o que tem. Ao sermos assaltados, ficamos putos e queremos que todos morram. É uma cadeia que ao contrário das outras, começa de cima para baixo. 

Quem sabe, no meu pensamento de "viajante", que classe média se unisse a bandidos que assaltam a própria classe média e todos fossem assaltar os políticos corruptos causadores de toda a guerra entre classes sociais. Para quem é a favor de dente por dente, olho por olho, esta talvez seria uma boa forma de se fazer justiça. Mas justiça mesmo, tirando de quem tira dos outros sem nem ao menos ter a desculpa de "precisar".