sábado, 19 de julho de 2014

O metrô.

Hoje eu acordei com vontade de escrever. Só uma história de histórias, não muito interessantes para ninguém, mas tudo bem. Hoje eu acordei pensando como a vida se encaminha...

Trabalhar em São Paulo, para mim, é novo. A experiência do metrô também. Há quem diga que eu me impressiono demais com as coisas, tipo caipira em cidade grande. Bem, realmente, eu não ligo. Eu gosto de manter os olhos abertos e ligados em qualquer detalhe. Gosto dessa coisa de reparar em tudo, desde a placa de aviso em caso de emergência até o jeito como alguém se segura no metrô. Claro que dessa forma, nem sempre os olhos veem aquilo que gostariam, mas tudo bem. Talvez a gente tenha mesmo que ver.

Um dos meus maiores medos sempre foi e ainda é, perder a sensibilidade perante as coisas da vida. Ser este tipo de gente que não se emociona com um cachorro abanando o rabo, não liga para a dor de quem passa fome, não luta mais e se esconde por trás da frase que "sempre foi assim e não vai mudar". Não escuta música.

Tenho medo do cansaço. Não o físico. O mental. Em mim, quando ele bate, é uma força tremenda que faço para ele ir embora. Até agora eu consegui. Espero conseguir sempre, até o dia que a vida de "lá" me chamar de volta.

Quando chego na estação, fico com aflição.  É tanta gente que parece que estou perdendo as pessoas. Como se todo mundo fosse interessante e eu não posso conhecer todo mundo. Queria ter vários olhos para ver em 360º e não perder nenhum detalhe. São os detalhes que se transformam em memória e mudam a nossa vida. São eles que a gente conta como história depois.

Bom, mas tenho que me conformar que isso é impossível e eu só posso enxergar até onde minha vista alcança (lembrando que tenho 2,5 de miopia junto com astigmatismo). Consciente dessa condição, vivo de óculos ou lente e tento fazer como minha mãe sempre me ensinou: "olhos de ver, filha". Sabe quando a gente não acha uma coisa e fica gritando "mãe, cade não sei o que", e daí a mãe vem com cara de poucos amigos, pára exatamente aonde a gente está posicionado e pega a "coisa" que estávamos procurando? Algo que estava na nossa frente e a gente não enxergava? Isso são os olhos de ver que minha mãe fala. "Se eu for aí e achar, vou esfregar na sua cara"... Bom, sei que em algum momento da vida, todos nós vimos essas "coisas" beeem de perto... rs. Obrigada, mãe!

Com os olhos de ver, eu tento levar a vida. E ouvidos de ouvir, também. Praticamente todo mundo ali usa fone de ouvido. Fico imaginando o que cada um está ouvindo. Pelas expressões faciais, eu tento adivinhar. Ontem, fiquei de pé ao lado de uma moça que carregava uma bolsa de plástico gigante rosa e tinha cabelos vermelhos presos num coque. Ela balançava a cabeça. Pensei: é rock! Dei um jeito de olhar o visor do celular. Era gospel da igreja evangélica de não sei da onde. Surpreendente!

Outro dia, foi um menino de cabelos longos. Com blusa do Metallica, ele entrou, ficou de pé e abriu um livro de Darwin. Achei que queria mostrar o livro que estava lendo. Dava um jeito de mostrar bem a capa para as pessoas. Dei risada e achei legal este orgulho em querer mostrar o seu nível de leitura. Espero que realmente ele leia, para si mesmo. Ao dar passagem para duas senhoras que se seguravam uma na outra, penso que ele respondeu ao meu questionamento.

O estilo das pessoas naquele lugar é outra coisa que me chama atenção. Tive a honra de sentar à frente de um senhor com seus 80 anos e estilo puro. De chapéu, blusa de lã, calça com pregas bem demarcadas, maleta e cachecol. Fora os sapatos e o óculos de grau moderno. Uma aula de moda. E um gentleman. Tive a impressão que também curtia a arte de observar as pessoas. Olhava tudo e todos que entravam a cada estação. Sorria "maroto" para quem olhasse para ele. Sorriu para mim. Desceu na Consolação. Até agora estou curiosa para saber o que ele carregava na maleta. Tento sempre usar minha intuição e ela me diz que ele era muito gente boa. Os olhos falam também, até mais que a boca.

Ah... o menininho que chorou. Este eu escrevo rindo. Metrô bombando às 18 horas. Um pai jovem (acho que era o pai, mas poderia ser irmão, enfim) entra com um menino aparentando ter uns 6 anos. Eles ficaram de pé. Os olhos do menino me pareciam assustados com tanta gente grande esmagando ele. Como se ele estivesse num desenho animado no mundo dos gigantes. Olhava só para cima. Dei uma olhada no celular e quando olhei para ele de novo, estava chorando. Um choro sentido, silencioso e envergonhado, com lágrimas escorrendo pelo pescoço. O pai ou irmão perguntou algo que eu não consegui ouvir, mas deve ter sido: "por que tá chorando?" Não sei o que ele respondeu, mas o cara caiu na risada e o menino chorou mais. Me deu uma vontade de rir... Aquela carinha de criança assustada tentando se controlar e o pai ao invés de consolar, cascando o bico e segurando na mãozinha dele era de qualquer forma, uma situação engraçada.

Aquele menino era a representação de nós adultos. Ou vai dizer que não dá vontade de chorar de vez em quando, quando o dia foi terrível e na hora de ir para casa, o metrô te aperta igual sardinha enlatada. A diferença entre ele e nós e que ele podia chorar e a gente achar bonitinho. A hora que ele desceu, a carinha dele de alívio, me fez ter outra crise de riso silenciosa. Peguei o celular e fingi que estava falando com alguém pra não dar de louca e ficar rindo sozinha.

Na quinta, foi a vez de uma moça chorar. Devia ter uns 28 anos. Estava parada na minha frente há um tempão, mas só reparei nela quando ouvi um soluço. Tinha os olhos vermelhos e a expressão triste. Senti vontade de perguntar, mas não tive coragem. Quando as pessoas em volta perceberam que ela estava chorando, um silêncio se fez. Parecia que de alguma forma, todos estavam condizentes à tristeza dela. O silêncio é sempre uma boa maneira de se dizer algo quando não há o que dizer. Ela desceu na estação Paraíso. Espero que encontre o paraíso dela, de verdade.

No primeiro dia de metrô, meio confusa ainda, sentei no banco reservado. Um senhor entrou e ficou de pé. Eu não fiz por mal, mas de verdade não reparei. Mas reparei numa moça olhando feio para mim. Fiquei incomodada, ainda mais por saber que com ela, eu não podia brigar. Ela era muito grandona para mim. Aquele incômodo foi crescendo e eu comecei a tentar ver o que tanto em mim, incomodava ela. Quando olhei para cima, a placa: assento reservado. Tudo explicado.

-Ai senhor me desculpa, não percebi. Quer sentar?
- Não mocinha, obrigado. Velho passa tempo demais sentado!

Ufa, que alívio! Não ia mais apanhar. Na mesma hora, a voz da consciência falou comigo: "Vanessa, precisa que o assento seja reservado para você oferecer seu lugar para alguém?" Pois é... a loucura de conviver com muita gente em pouco tempo, têm me ensinado muita coisa.

Mas, estou feliz. Em uma semana de rotina nova vi muitas cenas de gentileza. Não sei se eu que sou otimista, mas tenho a impressão que as pessoas estão mais civilizadas. Os mais jovens então... Vi vários dando lugar aos idosos, grávidas ou para quem parecia mais cansado que eles. Vi gente ajudando cadeirante para passar na rapidez da porta do trem. Vi vaquinha para ajudar um cara que perdeu a carteira. Eu ajudei com R$ 2,00. "Sou estagiária, moço". Ele deu risada. Vi olhos mais observadores do que cansaço e mais sorrisos. Homens respeitando as mulheres na passagem para a loucura da escadaria rolante.

Claro, vi também seguranças imobilizando um rapaz. Não sei o que ele fez, meu horário não permitia que eu ficasse ali observando até entender o que tinha acontecido. E a síndrome de Fifi me consome... Vi gente mal humorada com cara de poucos amigos. Vi meninos muito novinhos para estarem trabalhando como vendedor ambulante. Vi gente demais no celular, meu Deus... tem muitas pessoas olhando para baixo o tempo todo. Essa parte eu não gosto não.

Vi placas e grafites com dizeres sensacionais. Vi uma cidade que não para e que eu não pude deixar de me apaixonar. Cada dia gosto mais daquela loucura toda. E de quantos detalhes ela carrega.

Não me perdoo por uma foto que deixei passar: um carrinheiro carregava a sua dama no seu carro de catar papelão. Ela segurava um guarda chuva todo quebrado, sentada em pose de princesa. Me lembrou as moças da década de 30. A Catarina de "O Cravo e a Rosa". Era um foto imperdível com a legenda: "Sua Dama". Bom, transformei a foto perdida em palavras para ver se diminui a minha sensação de "coisas imperdíveis".

Talvez, como a maioria dos amores, um dia eu canse disso tudo e queira distância. Mas, como todo amor que nasce, a gente sempre torce para que ele dure para sempre.

Vamos ver quantas histórias mais o metrô vai me contar...

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